Em uma década no comando da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Jorge Guimarães, 75 anos, é visto como um técnico que conseguiu revolucionar a avaliação dos cursos de pós-graduação, servindo de modelo para algumas instituições internacionais.
Os 10 anos de Guimarães à frente da Capes, comemorados no dia 14 deste mês, são marcados pelo crescimento da produção científica, aumento do número de revistas brasileiras indexadas em bancos de literatura internacional e avanço do financiamento. Vale destacar que esse é o maior tempo de um titular já exercido na Capes, atrás apenas de Anísio Teixeira, fundador da instituição vinculada ao Ministério da Educação (MEC). Apesar da rotatividade dos líderes de cargos públicos em Brasília, Guimarães deve passar, agora, pelo quarto ministro da Educação. Passou por Tarso Genro, em 2004, passou por Fernando Haddad, Aloizio Mercadante, e agora José Henrique Paim.
Conforme a memória de especialistas, Jorge Guimarães é "aguerrido" em todas as frentes em que atua. Assim como na Capes, destacou-se como membro e diretor da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), membro titular da Academia Brasileira de Ciências e como diretor do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
No caso da produção científica, houve crescimento significativo a partir de 2003, segundo Jair Mari, coordenador da Pós-Graduação do Departamento da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que trabalhou como consultor da Capes durante seis anos na gestão de Guimarães.
Segundo lembra Mari, em 2003 o Brasil figurava entre a 25ª ou 26ª posição no ranking mundial de produção científica, correspondente a 2 mil artigos, e em 2011 passou a ocupar o 13º lugar, com 16 mil artigos científicos. "O Brasil subiu oito vezes, uma velocidade maior do que a média mundial, se aproximando de países desenvolvidos", analisou Mari.
Mari atribuiu esse desempenho a algumas características de Guimarães na liderança da pasta. "Preparo acadêmico, visão e conhecimento profundo sobre o sistema de pós-graduação do país."
Com opinião semelhante, a presidente da SBPC, Helena Nader, ressalta a importância da atuação "de técnicos em cargos que podem mudar" políticas de um país. "O Jorge Guimarães é a alma da reestruturação de avaliação da Capes", disse Helena. "Estão de parabéns os governos que enxergaram nisso uma grande importância e não um cargo político para ser leiloado nas instituições."
Aumento de financiamento - Outro marco da gestão de Jorge Guimarães nesta década é o aumento substancial do financiamento da Capes, embora tal avanço seja embalado pelo crescimento econômico. Segundo dados de Mari, o financiamento da Capes cresceu seis vezes, praticamente, em uma década, de R$ 500 milhões, em 2004, para R$ 3 bilhões em 2011. Hoje, segundo informações da Capes, o montante supera R$ 5 bilhões.
"Lógico que isso bate com o aumento do financiamento em geral do Governo federal, uma vez que o PT (Partido dos Trabalhadores) pegou uma economia mais estável, proporcionando aumento substancial do financiamento", analisa Mari.
A evolução do financiamento da Capes, segundo avaliam especialistas, refletiu no aumento de bolsistas. Dados da Capes informam que o número de bolsas no Brasil e no exterior evoluíram de 31 mil em 2004 para 275 mil em 2013.
Houve também aumento no número de alunos matriculados nos cursos de doutorado, segundo o especialista da Unifesp. O contingente saltou de 40 mil em 2003 para 64 mil em 2010. Hoje, Mari acrescenta, o Brasil possui 1,4 doutor por mil habitantes, ainda distante de países como Alemanha, com 15; e Suíça, com 23. "Mas o Brasil lidera de longe a América Latina." Na Argentina, por exemplo, existem 0,2 doutor para um universo de mil habitantes.
Sem citar dados comparativos, Mari acrescentou que o Brasil titula hoje 12 mil doutores por ano; 40 mil mestrados e 350 mil mestrados profissionais anualmente.
Avanço da produção científica - Diante de tal cenário, o especialista da Unifesp assegura, com base em dados internacionais, que o Brasil produz hoje 34 mil artigos, o equivalente a 2,7% no ranking mundial, enquanto há dez anos, início de Jorge Guimarães no comando da Capes, esse percentual se aproximava de 1%.
"Isso é reflexo do aprimoramento da avaliação dos cursos de pós-graduação, que passou a ser comparada com parâmetros internacionais, melhorando muito a visibilidade da produção brasileira e a qualidade também."
Na esteira do crescimento da produção científica, cresceu também o número de revistas brasileiras indexadas às bases internacionais, chamadas de "Journal Citation Reports" (JCR). Ou seja, aumentou a quantidade de revistas brasileiras internacionalizadas, com publicação de artigos científicos em inglês. "Há 10 anos, tínhamos, aproximadamente, 19 publicações científicas indexadas, enquanto hoje esse número se aproxima de 120", observa Mari.
Outro avanço é o Brasil assinar hoje 36 mil títulos de revistas científicas internacionais, disponibilizadas para os programas de pós-graduação nacionais. "Essa é uma ideia incrível, de criar uma biblioteca virtual, moderna, permitindo o acesso dos estudantes de Norte ao Sul do país."
Ao buscar resumir a atuação de Jorge Guimarães à frente da Capes nesta década, Mari enfatiza: "A pós-graduação está em boas mãos. A Capes lida com a academia e a academia é a Capes, hoje um sistema de avaliação dos cursos de pós-graduação totalmente transparente, de boa qualidade e de baixo custo, frente ao trabalho que ela faz."
Identidade própria - Em outra frente, a presidente da SBPC lembrou que, além do padrão de qualidade de avaliação dos cursos de pós-graduação, a Capes assumiu o desafio de criar outros programas para a educação básica, em uma tentativa de melhorar a formação de professores do ensino médio. Cita como exemplo, o chamado Capes do Ensino Base, conhecido como Capes do B. A instituição também criou o programa "Iniciação à Docência" que, segundo Helena, está mudando o perfil do estudante formado hoje em licenciatura, fator que surtirá impacto positivo futuramente.
Os especialistas lamentam o fato de os cursos de graduação não passarem pela avaliação da Capes. "Pena que não temos esse sistema de avaliação na graduação. As faculdades de medicina, por exemplo, não são avaliadas", lamentou Mari.
Helena Nader concorda com essa avaliação. "Eu adoraria ter também uma Capes avaliando a graduação do Brasil."
(Viviane Monteiro/Jornal da Ciência)
Este texto foi publicado na página 6 do Jornal da Ciência impresso que traz esse e outros assuntos. O acesso está disponível emhttp://www.jornaldaciencia.org.br/impresso/JC753.pdf