Tem alguém cansado de falar em COVID aí?
23/07/2020

E lá se vão quase seis meses. Exceto janeiro, quando líamos notícias vindas da China, e fevereiro, quando ainda tivemos um gostinho de “vida normal” até o carnaval, mas já sob tensão, 2020 apresenta-se como um ano que certamente será inesquecível e, sem dúvida nenhuma, muito denso, tenso e difícil.

O novo coronavírus chegou e veio para ficar. É e será mais uma ameaça a nossa vida, assim como o sarampo, a tuberculose, o HIV, a violência e os acidentes automobilísticos. Agora, porém, ele é a novidade que nos fez lembrar do quanto somos vulneráveis. E não toleramos reconhecer que somos frágeis. Queremos certezas e segurança total. Óbvio que há momentos em que estamos no controle, porque, se não fosse assim, ninguém se arriscaria em esportes radicais. Só que, para esses esportes, existe a satisfação da adrenalina e todo um aparato de proteção à vida.

Com a COVID-19, a adrenalina vem com uma tensão permanente. De um “inimigo” invisível aos olhos, mas que causa dor. De uma estatística que pode nos colocar longe do risco, mas que, quando nos alcança, faz doer no corpo ou na alma, pela doença em si ou perda de um amor.

Vemos pelo mundo exemplos diversos de comportamentos, tecnologias, abundância e escassez de recursos, conflitos.

Bares cheios em sinal da quase total falta de respeito pelo outro não são privilégio do Leblon. Estão cheios também em Padre Miguel. Em países como França, Espanha, Estados Unidos (e por aí vai…), o ser humano revela-se uma caixinha de surpresas. Não me surpreende que, por vezes, se esqueça do próximo por estar centrado em seu egoísmo ou sensação de invencibilidade.

Com a COVID-19, a adrenalina vem com uma tensão permanente. De um “inimigo” invisível aos olhos, mas que causa dor. De uma estatística que pode nos colocar longe do risco, mas que, quando nos alcança, faz doer no corpo ou na alma, pela doença em si ou perda de um amor.

Por aqui no Brasil, infelizmente experimentamos um país fragmentado em todos os aspectos. Temos as evidências de um mundo gritando que a doença existe, pode ser grave e é preciso se cuidar. No entanto, líderes da nação, de estados e municípios continuam, por exemplo, levando o vírus ao tribunal e determinando que ele não atravessará as fronteiras de um shopping center que, em São Paulo, tem metade das lojas abertas em um município e a outra metade fechada em outro.

O coronavírus expôs nossas mazelas de desemprego e falta de água e esgoto. Pedimos à população que se coloque em distanciamento social, mas como se utilizamos ônibus superlotados e temos um prefeito que libera, por decreto, as pessoas para estarem nesses mesmos ônibus, em pé?

Tudo isso cansa mais do que qualquer coisa.

Sinais trocados em discussões infinitas nas quais as ciências foram resumidas apenas à Biologia, como se esta quisesse dar a última palavra. E a economia tentando passar à frente da vida… Impossível. Sem vida não se faz girar a economia.

Não estamos cansados apenas de limpar as compras. Não estamos apenas exaustos de ficar confinados em casa – quem pode! – com filhos, cães e gatos que pedem atenção em nossas conferências pelo computador.

A parte mais dura é que consumimos energia por falta de diálogo, de uma liderança, referência conciliadora que “aproveite” tudo que temos de melhor como estatísticos, epidemiologistas, economistas, sociólogos, entre outros, para nos apoiarmos com bom senso e nos prepararmos para o dia seguinte, celebrando o hoje.

Não haverá um dia como o Réveillon para o novo normal. A vida não parou. O que parou foi o calendário escolar. Algumas contas foram renegociadas e a novela de hoje é reprise de ontem. Nossas células, contudo, viveram mais um dia e nenhum aniversário será postergado.

Viva o hoje. Carpe diem! Que possamos levar bom senso e moderação nas nossas decisões!

Ninguém viverá trancado em casa, em uma bolha estéril, ainda a única garantia de que não teremos contato com o novo coronavírus. Então, que se viva intensamente tudo que se quer viver, com todos os cuidados que conhecemos, como os esportes radicais nos mostram! Que a lavagem de mãos, máscaras e a distância física entre nós sejam respeitadas, mas que não nos distanciemos da boa energia, do cuidado com o próximo e do amor!

Vale rever o voto na próxima eleição. Vale pensar que as desigualdades sociais só reforçam o que vivemos atualmente. Vale trabalhar pela ciência, seja qual for, e que a convivência de todos seja dialética e verdadeira!

Talvez o movimento dos “sem vacina” repense suas premissas. Talvez possamos mudar mesmo. Mas já vale se só por hoje estendermos a mão para ajudar alguém. Faz bem para a alma e para o coração.

Chrystina Barros é pesquisadora do Centro de Estudos em Gestão de Serviços de Saúde (Cess/Coppead/UFRJ).

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Fonte: Site Conexão UFRJ (Adaptada)